E não tem nada a ver com o facto de ele ter ganho agora o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, com um livro que, para mim, foi um dos melhores de 2009 (Deixem Passar o Homem Invisível). Nem com aquele jeito de misturar erudição com humor negro, ou de acabar uma frase com tudo menos aquilo com que pensávamos que ia acabar quando a frase começou. Ou melhor, tem a ver com isso mas sobretudo com um texto específico escrito para a Time Out Lisboa e publicado há um ano. O tema era Como eu escrevo, e ele escreveu isto:
Como não escrevo. Não escrevo sem lavar os dentes, as palavras ganham sarro e devem sair frescas da boca para a ponta dos dedos. Não escrevo sem pensar que são quê, cinco da manhã, voltaste a acordar antes do sol e é bom que tenhas algo a dizer na confusão do mundo. Não escrevo de barriga cheia ou com vestígios de ressaca. Reduz o horário de escrita do ano, mas nada a fazer. Se começas a ficar tonto, come as palavras que estão a mais, há sempre muitas. Quando não aguentares o jejum, se a própria fome te engorda a frase, vai ao frigorífico e repõe o açúcar e o sal no sangue.
Não escrevo sem pensar nas possibilidades do ridículo de escrever, que nunca acabam. Não escrevo sem pensar que posso ser mais uma pessoa que devia fazer outra coisa na vida. Não escrevo sem perceber que então ia fazer o quê?
Agora como escrevo, se conseguir. Escrevo contra a maldade e a ignorância que estão dentro de mim. Escrevo também a favor delas, são adversários magníficos a quem foram dados muitos anos de avanço.
Escrevo a pensar nas formas impossíveis do amor, se for preciso inventa-se mais uma verdadeira.
Escrevo contra a escravatura das religiões, a obrigatoriedade da fé que tanto mal faz às crianças da Terra. Tenho respeito por Deus, mas se existe é má pessoa. Eu mudava de atitude, com tantos poderes.
Escrevo a combater as conspirações da realidade, a meio desta frase lá está ela a conspirar, algures. Apesar de tudo, acredito que a vida triunfa, não escrevam Fim antes de acabar a história. Sou um optimista mas não percebo porquê. E se isto fosse fácil era para os outros, como dizem os marines e disse uma pessoa que amei. Escrevo porque me pediram para escrever e porque me pediram para não escrever e foram todos bons conselhos de gente formidável. Escrevo porque tenho muitos amigos e amigas e alguns deles são um pouco malucos. E tenho filhos e pais e irmãs.
Escrevo porque viajei e vi injustiça e sofrimento. Não serve de nada escrever sobre desgraças, ou quase nada, mas algum nada temos de fazer. Muito do sofrimento que vi é meu e português e mundial. Também faz rir, mas acredito que o humor é aprofundar, não aligeirar.
Escrevo contra as pessoas parvas.
Escrevo porque as mulheres são bonitas e cheiram bem. E pelos vivos e pelos mortos, as pessoas vivem e de repente morrem-nos. E o mar tem peixes e os bosques pássaros e o esgotos ratos. Escrevo porque é uma profissão interessante, há de certeza melhores, mas não me calharam nem podia ser.
Se isto não é o melhor texto sobre a escrita, não sei qual poderá ser. E é por isso que volta e meia cá volto a lê-lo. E que digo sempre: quando for grande quero escrever como o Rui Cardoso Martins.
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
Coisas que deviam ser proibidas quando se regressa de férias
(e que não param de me acontecer):
- ter de trabalhar até à meia-noite e meia logo no segundo dia;
- ir acabar de desvitalizar um dente e estar 40 minutos de boca aberta a pensar "eu estava tão bem na praia, eu estava tão bem na praia";
- chover.
- ter de trabalhar até à meia-noite e meia logo no segundo dia;
- ir acabar de desvitalizar um dente e estar 40 minutos de boca aberta a pensar "eu estava tão bem na praia, eu estava tão bem na praia";
- chover.
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
Um bom problema
Depois da dor de cabeça dos spreads e das contas e das mil declarações para conseguir ter crédito. Depois do imposto de selo, das mil e uma comissões, das avaliações e do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (só o nome dói). Depois do reconhecimento das assinaturas, das rubricas feitas à exaustão, dos seguros de vida, das novas palavras aprendidas (palavras feias como distrate), das reclamações e da voz monocórdica das conservatórias, tenho um novo problema, um bom problema: Preciso de arranjar um porta-chaves para as chaves da casa nova.
A minha casa.
A minha casa.
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Hable con ella
"A las mujeres siempre les gusta que uno las tenga en cuenta."
O Almodóvar é que sabe.
O Almodóvar é que sabe.
segunda-feira, 9 de agosto de 2010
O amor nos setentas
Na semana passada tive um daqueles encontros que ficam e me deixam a pensar durante vários dias, quem sabe mais ainda. Conheci uma senhora nos seus 70 anos, de vestido florido e sorriso de orelha a orelha, que na fila de espera para arranjar mesa numa pizzaria se pôs a conversar um bocadinho comigo e com a minha mãe, que também lá estava. Não sei o que me impressionou mais, se a enorme alegria que ela tinha, se o facto de nos confessar, logo de início, que era uma romântica incurável e que era assim desde pequena, quando ia ao cinema Paris (que hoje já nem existe) e saía de lá a sonhar com a maravilha daquilo tudo. Dizia ela que hoje em dia não consegue ligar a televisão de manhã, porque não gosta e faz muito barulho, mas que tem a rádio a dar música todo o dia. Que ter aquilo ligado a anima, porque vão passando as músicas de que gosta (e ao explicar isto deu quase um passinho de dança) e tem sempre companhia. Não que viva sozinha, porque é casada e vive com o marido, um rapaz que conheceu ainda miúda, numas férias de Verão, e que a levou da sua Lisboa – “do que eu tenho saudades é das noites quentes de Verão” – para se tornar no companheiro que ainda tem hoje em dia.
“Agora já está velhote mas ainda é um belo homem, não é?”, perguntou-nos, fazendo um movimento com os olhos em direcção a um senhor alto e com um farto cabelo branco encostado mais ao fundo, junto ao balcão.
Acho que se calhar foi isso o que mais me impressionou. O orgulho com que ela disse aquilo. “É um belo homem.” E depois o olhar fixo a confessar “só tenho medo de quando nos separarmos. Quando nos separarmos, sabe”, com aquela certeza de que só a morte pode fazer uma coisa dessas. “Gostava que fosse ao mesmo tempo.”
Nunca pensei que fosse possível ter 27 anos e ter inveja de um amor destes. Ou daquela alegria de ter tudo onde é suposto estar, exactamente no sítio, mesmo com todas a rugas por cima.
Só sei que eles se sentaram na mesa com outro casal e conversaram o tempo todo, ou pelo menos o tempo todo em que eu consegui espreitar pelo canto do olho.
Esta senhora de quem nem sei o nome sonhava com os filmes que via no cinema Paris. Eu, depois de a conhecer, sonho em ter setenta anos e ter um amor assim. Ou mesmo trinta. Se nos trintas o meu amor for como aquele, e a minha costela romântica ainda sobreviver sem mais nenhuma fractura, já não era nada mau.
“Agora já está velhote mas ainda é um belo homem, não é?”, perguntou-nos, fazendo um movimento com os olhos em direcção a um senhor alto e com um farto cabelo branco encostado mais ao fundo, junto ao balcão.
Acho que se calhar foi isso o que mais me impressionou. O orgulho com que ela disse aquilo. “É um belo homem.” E depois o olhar fixo a confessar “só tenho medo de quando nos separarmos. Quando nos separarmos, sabe”, com aquela certeza de que só a morte pode fazer uma coisa dessas. “Gostava que fosse ao mesmo tempo.”
Nunca pensei que fosse possível ter 27 anos e ter inveja de um amor destes. Ou daquela alegria de ter tudo onde é suposto estar, exactamente no sítio, mesmo com todas a rugas por cima.
Só sei que eles se sentaram na mesa com outro casal e conversaram o tempo todo, ou pelo menos o tempo todo em que eu consegui espreitar pelo canto do olho.
Esta senhora de quem nem sei o nome sonhava com os filmes que via no cinema Paris. Eu, depois de a conhecer, sonho em ter setenta anos e ter um amor assim. Ou mesmo trinta. Se nos trintas o meu amor for como aquele, e a minha costela romântica ainda sobreviver sem mais nenhuma fractura, já não era nada mau.
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Uma boa notícia
Já temos escritura marcada: sexta-feira, dia 13 de Agosto.
Ter superstições é parvo, não é?
Ter superstições é parvo, não é?
terça-feira, 15 de junho de 2010
Dilemas
Uma viagem a Nova Iorque ou um closet?
Um vestidinho para o Verão ou um cesto para guardar a roupa suja?
Um iphone ou um sofá?
Umas Melissas da Vivienne Westwood ou uma sanita?
São estas as perguntas que me assaltam nos últimos tempos. É esta a minha nova realidade, agora que decidi tornar-me uma endividada para a vida e comprar casa. É linda e maravilhosa e ainda não é minha e do meu amor, mas já não falta muito.
Um vestidinho para o Verão ou um cesto para guardar a roupa suja?
Um iphone ou um sofá?
Umas Melissas da Vivienne Westwood ou uma sanita?
São estas as perguntas que me assaltam nos últimos tempos. É esta a minha nova realidade, agora que decidi tornar-me uma endividada para a vida e comprar casa. É linda e maravilhosa e ainda não é minha e do meu amor, mas já não falta muito.
terça-feira, 13 de abril de 2010
quinta-feira, 8 de abril de 2010
Estamos apaixonados outra vez
Estamos apaixonados outra vez. Há dois meses. Com mensagens de saudades uma hora depois de nos vermos, coelhos da Páscoa de chocolate partilhados no sofá, maratonas de séries e filmes até de madrugada, passeios de mão dada por todo o lado em que a mão nunca se larga, noites em colherzinha ou cadeirinha (qualquer uma das expressões é tão parva e tão boa), planos para Abril, para Maio, para Junho, para o fim do ano. Eu sei que não acreditava em reconciliações. Que disse que há males que nunca se curam por mais que se viva. Que as pessoas não mudam. Que há coisas que se partem e que são impossíveis de voltar a colar e nunca mais ficam as mesmas. Mas agora apetece-me escrever que as relações crescem, como as pessoas e os cabelos. Que afinal nem a maior das desilusões é irrecuperável, se o sentimento continua lá e continua em pé apesar de toda a pancada, e é recíproco. Que é normal ter altos e baixos e desanimar quando o baixo está tão baixo mas tão baixo que parece que nunca mais vai voltar a subir. Que a pessoa que nos fez dizer que estamos fartos de surpresas pode ser a pessoa que nos deixa outra vez com aquela ansiedade idiota na barriga. Que é preciso saber reconquistar uma pessoa tanto quanto é preciso saber deixar-se ser reconquistado. Que estou uma lamechas e uma peganhenta outra vez e que se me pedirem conselhos amorosos e me ouvir a mim própria em voz alta vou parecer saída directamente da história da Branca de Neve ou da Pocahontas. Mas não me importo. Porque tudo é infinitamente melhor assim.
terça-feira, 9 de fevereiro de 2010
Está visto
Este blogue vive do meu coração estilhaçado. Se estou bem ou quase feliz (aí está uma palavra que não pensei voltar a empregar tão cedo), fico tão produtiva como um koala agarrado a um eucalipto.
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Uma anedota sobre o amor
No primeiro número da revista Love (que saiu sensivelmente há um ano mas eu só estou a ler agora, tão típico meu), perguntaram ao director editorial da Interview qual era a melhor e a pior forma de mostrarmos a alguém o nosso amor.
E ele respondeu isto (tão bom):
"What's the old joke? If you love someone set them free.
And if they don't come back, hunt them down and kill them."
E ele respondeu isto (tão bom):
"What's the old joke? If you love someone set them free.
And if they don't come back, hunt them down and kill them."
sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
Está a chover há dois meses
Devem ter partido o coração ao São Pedro mais ou menos na mesma altura em que me partiram o meu.
quarta-feira, 13 de janeiro de 2010
Realizei um sonho de miúda
Comprei uma saia cheia de penas pretas. É para usar numa festa, sim, mas entretanto vou só ali dançar uns passinhos do Lago dos Cisnes e já volto.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
Disponibilidade
Antigamente eu não pensava assim. Antigamente eu não achava que o amor podia ser uma questão de disponibilidade. Não eram palavras que rimassem. Amor é amor, achava eu. É amor no Pólo Norte ou no Equador, no Inverno ou no Verão, de dia ou de noite. Não havia um tempo para o amor, na minha cabeça. Amor era amor, capaz de surgir no meio de um tremor de terra ou de um assalto, se fosse preciso.
Agora não é assim. Agora pensar em disponibilidade faz sentido. Agora vejo que há momentos em que é impossível o amor. É impossível abrir o coração quando nem se sabe onde ele anda. É impossível pensar em dar, ou mesmo em receber, quando há apenas cansaço. Quando a palavra esforço entra na equação. Quando o amor não é maluco e doido como quem se atira de um avião com pára-quedas porque simplesmente não há força para dar o salto, mesmo equipado. Agora eu olho para trás e acho que quando duas pessoas se apaixonam e começam uma relação com uma disponibilidade completamente diferente para o amor uma das duas vai herdar um cansaço que não é o seu.
Eu herdei um cansaço que não tinha a ver comigo, que não era eu, que não tinha sido eu. Não é justo, mas é verdade. E sei agora que o amor pode muita coisa mas não pode tudo. Pode adiar o cepticismo, pode contornar a sensação de fracasso, pode entusiasmar-se durante uns tempos, mas se começar cansado, vai acabar cansado.
Por isso perguntam-me por amores, por interesses, por jantares a quatro ou por ocasiões para apresentar não sei quem, como se estar sozinha fosse algo que tivesse de ser resolvido o quanto antes. Como se fosse quase contagioso. Mas eu não quero. Não agora. Não com o meu coração cansado e com os meus sonhos cansados e esta sensação de que alguma coisa se partiu e pode não ter conserto.
Porque agora sei que sim, o amor também é uma questão de disponibilidade. Que nem sempre se tem.
Agora não é assim. Agora pensar em disponibilidade faz sentido. Agora vejo que há momentos em que é impossível o amor. É impossível abrir o coração quando nem se sabe onde ele anda. É impossível pensar em dar, ou mesmo em receber, quando há apenas cansaço. Quando a palavra esforço entra na equação. Quando o amor não é maluco e doido como quem se atira de um avião com pára-quedas porque simplesmente não há força para dar o salto, mesmo equipado. Agora eu olho para trás e acho que quando duas pessoas se apaixonam e começam uma relação com uma disponibilidade completamente diferente para o amor uma das duas vai herdar um cansaço que não é o seu.
Eu herdei um cansaço que não tinha a ver comigo, que não era eu, que não tinha sido eu. Não é justo, mas é verdade. E sei agora que o amor pode muita coisa mas não pode tudo. Pode adiar o cepticismo, pode contornar a sensação de fracasso, pode entusiasmar-se durante uns tempos, mas se começar cansado, vai acabar cansado.
Por isso perguntam-me por amores, por interesses, por jantares a quatro ou por ocasiões para apresentar não sei quem, como se estar sozinha fosse algo que tivesse de ser resolvido o quanto antes. Como se fosse quase contagioso. Mas eu não quero. Não agora. Não com o meu coração cansado e com os meus sonhos cansados e esta sensação de que alguma coisa se partiu e pode não ter conserto.
Porque agora sei que sim, o amor também é uma questão de disponibilidade. Que nem sempre se tem.
domingo, 10 de janeiro de 2010
E hoje acordei assim...
sexta-feira, 8 de janeiro de 2010
sábado, 2 de janeiro de 2010
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