domingo, 8 de abril de 2012

A idade

Durante muito tempo, a minha avó foi a pessoa mais alegre que eu conheci. Dava gargalhadas que doíam nos ouvidos e usava o cabelo curto, o que fazia com que os olhos lhe parecessem ainda maiores. Durante muito tempo, a minha avó foi a minha melhor amiga dos fins-de-semana e deixava-me roubar-lhe o sofá-cama e espreitar os filmes do Freddy Kruger de quem eu tinha tanto medo, mas queria ver. Nesse tempo, podíamos adormecer a ver televisão mas também a conversar até as pestanas parecerem pesadas, porque o assunto nunca se acabava e eu sabia que queria ser assim quando fosse grande, sempre com qualquer coisa para dizer. E depois os anos passaram. E a distância que não parecia nenhuma alargou, como um sapato demasiado usado. A minha avó reformou-se, continuou a viver sozinha mas deixou de ter assunto. Ou de dar gargalhadas alto. O cabelo continuou curto, mas mais fino e ralo. Os filmes continuaram a dar na televisão mas se os vemos juntas ela acaba por fechar os olhos e adormecer, sem grande interesse. Não segue propriamente a história, há personagens que confunde, momentos que esquece, e é assim com a ficção mas também com a vida real. Esquece-se, baralha-se, teima que não fez coisas que acabou de fazer. O médico diz que algumas células do cérebro já morreram, já não voltam, é a idade. Assim, como se fosse a lei mais evidente deste mundo, e não doesse.

15 comentários:

Anónimo disse...

Um grande beijinho

Imperatriz Sissi disse...

Gostei muito do texto...com a minha avó passou-se o mesmo.

jessi-aleal.blogspot.pt

Bárbara disse...

eu sei o que é isso tudo... keep it forever.

Maria Pitufa disse...

Sabes passei por isso, e chegou a uma altura que a minha avó já baralha os parentesco, já não sabia quem é que eu era... e por aí em diante! E o melhor que faço é recordar os melhores momentos dela, porque mesmo na fase em que a memória já a traía, ainda tinhamos grandes momentos! Aproveita-os!!

S* disse...

Lamento muito, infelizmente a idade acaba por nos levar capacidades... mas esperemos que o amor e as memórias dos bons tempos perdurem.

Patty disse...

Beijinho apertado Sis*

Alexandra, a Grande disse...

Eu e tu às vezes estamos em sintonia. :(

Unknown disse...

Eu ja passei pelo mesmo.
Força e muitos beijos!

http://acoisa-maisfofa.blogspot.pt/

dreams disse...

Fica para sempre os momentos bons e inesquecíveis, e o apoio que agora tanta falta lhe faz. Coragem e muita força, beijokinhas!!

Anónimo disse...

Um beijinho enorme de quem não tem esse tipo de recordações partilhadas com as avós! E a ausencia desses momentos também são dolorosos! Por isso recorda com um sorriso gigante os momentos qu epassaram juntas!

Carla Santos Alves disse...

Tens uma mão cheia de recordações e isso ninguém apaga!

Vespinha disse...

A minha avó nunca chegou a esse ponto, porque aos 73 anos, com uma vida ativa em que até conduzia, o rebentamento de um aneurisma tirou-lhe a vida em 2 horas. Tenho muitas saudades dela.

Miss Cheque-Mate disse...

a minha avó está a perder a paciência e a audiação, já adormece a ver as novelas que tanto gosta, passando as 8h da noite o destino dela tem de ser a cama ... custa ver alguém que viamos com tanta vida estar a envelhecer assim. os avós deveriam ser eternos

ANA disse...

Os últimos momentos de vida do meu avô foram muito maus...o cancro consumiu-o por completo, já não se lembrava de grande parte das coisas. Lembro-me de sair a chorar do hospital porque não se lembrava de quem eu era, porque tivemos que lhe explicar onde ficava a nossa casa...as memórias tinham se apagado. Mas recordo também com carinho os poucos momentos de lucidez, a última vez que me sorriu, disse-me olá e fechou os olhos, mal eu sabia que para sempre. Amanhã faz nove meses que ele partiu e todos os dias penso que só o queria ver uma última vez. Aproveita os momentos com ela enquanto podes...
Desculpa a intromissão.

Sexinho disse...

Doi...