segunda-feira, 28 de abril de 2008

Fim-de-semana prolongado

Foi assim que desliguei o carro e troquei os ténis pelos chinelos. Foi assim que senti aquele calor e sol imenso, que nem cheirava a mar, cheirava a quente. Foi assim que fui à praça e a senhora dos legumes e das guloseimas me cumprimentou como quem não me via há meses mas agora é que vai ser. Foi assim que arejei a casa como deve ser, e abri os estores até à última ripa, e o sol, já muito mais alto, entrou pelo quarto e pela corredor fora. Foi assim que voltei a adormecer na praia e a só acordar com os gritos das criancinhas (ou dos pais das criancinhas). Foi assim que o café a que vou sempre voltou a ter gelado de framboesa e eu a comer uma bola num copo e a ficar com os lábios cor de rosa. Foi assim que à noite me pude sentar na varanda a escrever e nem uma aragem, só calor e silêncio. Foi assim que as calças de ganga, no domingo à noite, pareceram apertadas e desconfortáveis, por causa do sal e de três dias sem outra roupa que não o bikini.

Foi assim que fiquei outra vez cheia de sardas, como é hábito sazonal. E foi assim que fiquei, oficialmente - e para que conste - em modo verão.

The Man I Love

Some day he'll come along,
The man I love
And he'll be big and strong,
The man I love
And when he comes my way
I'll do my best to make him stay.

He'll look at me and smile
I'll understand
And in a little while,
He'll take my hand
And though it seems absurd,
I know we both won't say a word

Maybe I shall meet him Sunday
Maybe Monday, maybe not
Still I'm sure to meet him one day
Maybe Tuesday will be my good news day

He'll build a little home
Just meant for two,
From which I'll never roam,
Who would - would you?
And so all else above
I'm waiting for the man I love.

Sou tão fácil...

Gosto imediatamente de uma pessoa se vejo que ela gosta da minha cadela.

terça-feira, 22 de abril de 2008

A primeira vez

Hoje, ao falar de Jacques Becker, um realizador português à beira dos 70 anos disse aos seus alunos:
"Se nunca viram nada dele, vejam os filmes que ele fez, sobretudo o Casque d'or e o Touchez pas au grisbi ". E parou, para continuar:
"Tenho inveja vossa. Se nunca tiverem visto. Inveja dessa primeira vez. Eu já só posso recordar, rever."
Isto deixou-me a pensar numa série de coisas... como é costume na minha cabeça, das mais problemáticas às mais parvas, incluindo naquela música dos Anberlin em que ele canta "I wanna be your last first kiss", verso que achei, durante muito tempo, o mais bonito que me poderiam dizer. Claro que são coisas diferentes, o maravilhamento da descoberta de um autor de eleição ou de uma obra-prima, e o começar uma história de amor. Mas a forma como eu encaro esse simples verso agora (antigamente era um sinal do maior devoção possível, hoje é um sinal de um apaixonado possessivo em potência), demonstra como a ideia de só haver uma primeira vez, uma só, já não é para mim o mesmo que era há uns tempos (ou então é apenas mais uma prova de que me encontro realmente no grau zero do romantismo).
Hoje, e cada vez mais, é quase angustiante pensar que só há realmente uma primeira vez para tudo. Que o que é complemente novo num momento, no seguinte já não o vai ser, e que é assim até à exaustão, com tudo. Repetição atrás de repetição.
Acho que isso explica porque é que é tão irritante e tem um travo tão desmancha prazeres quando nos contam o final de um filme no momento em que ainda mal o começámos a ver, ou porque é que é quase sempre tão desapontante experimentar algo que já tem, à partida, expectativas mais altas que o Everest.
Não sei... Acho que, resumindo e concluindo, fiquei com vontade de ver qualquer coisa do Jacques Becker. Nunca vi nada dele.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Minutos valiosos

Nunca gostei das estatísticas que, a partir de um valor absoluto, dividem os resultados por milhentas categorias e apresentam os valores esmiuçados como tão certos quanto os originais. Mas hoje, ao ler um artigo sobre o Cristiano Ronaldo na Visão, gostei ainda menos.
A partir de dados retirados da revista France Football, fiquei a saber que o Cristiano Ronaldo ganha, por ano, 19.5 milhões - milhões! - de euros. Isto já roça quase o insultuoso, mas dividido pelas tais milhentas categorias, ainda se torna mais penoso para o comum mortal que anda a penar todo o mês e a esticar cada centavo. Pois 19,5 milhões de euros são, nada mais nada menos que:
1.625 milhões por mês;
54.166 por dia;
6.770 por hora;
113 por minuto.
Cento e treze euros por minuto??? Cento e treze euros? Por minuto? O mesmo minuto que se gasta assim, num tirinho? Num minuto sou eu capaz de gastar 113 euros, agora ganhar… já é mais difícil.
Eu não percebo. Não percebo. Não percebo porque é que queimei as minhas pestaninhas a tirar um curso, porque é que trabalho horas extraordinárias, às vezes fins-de-semana, para isto. Para nem sequer aspirar à geração mil euros, porque para os mil ainda me falta um bocadinho.
E não percebo, não percebo, não percebo, Cristiano Ronaldo, porque é que quando me viste no CCB, não te deu o piripaque e não me quiseste adoptar. Eu tinha dito que sim.

sábado, 12 de abril de 2008

Almoços solitários

Quando aproveito a hora de almoço para tratar de burocracias, como ontem, é certo e sabido que vou ter de almoçar sozinha, a correr. Confesso que me deprime um bocadinho a ideia da garfada solitária, o não ter para onde olhar (em casa não me importo nada, tenho a televisão e mil dvds para ver), o não ter com quem falar. Nem é a ideia de estar sozinha, que tenho aprendido a valorizar nos últimos anos e que até me sabe bem, ao ponto de ter saudades quando é demasiada a informação e as solicitações e pouco o tempo para parar, pensar e estar sem ninguém por perto. Dizia eu que nem é a ideia de estar sozinha, é antes um desconforto de não saber onde pousar os olhos, de desvirtuar um acto que devia ser comunitário e de haver uma tendência para engolir tudo sofregamente, o que não é nem de longe aconselhável e me deixa quase sempre com azia.
É por isso que, quando tenho de ir almoçar sozinha, tenho um truque: procuro um mesa junto a um grupo (duas pessoas bastam) que esteja animado, e sento-me ao lado para ouvir a conversa. Não é bonito e vai contra uma das regras básicas das boas maneiras, eu sei, mas também nunca ouvi nada de especial - as pessoas falam da manhã que tiveram, do tempo, do fim-de-semana, do trabalho, aqui e ali de relações, de ralações e projectos. É uma distracção, de certa forma uma companhia.Mas ontem, quando na mirada (in)discreta procurei esse tal lugar, constatei que a grande maioria das pessoas estava a almoçar sozinha. Mesa sim mesa sim, num daqueles espaços abertos de restauração de centro comercial, seguiam-se almoços solitários, rápidos. Não sei se as razões eram as mesmas que as minhas, se toda a gente resolveu aproveitar para tratar de burocracias, se pura e simplesmente não têm companhia ou se estão fartas umas das outras e precisam desse tal tempo para parar, pensar e estar sem ninguém.Sei que foi uma constatação triste. Aqueles olhos parados num ponto do infinito ou distraídos numa revista ao lado do prato, no meio de um espaço tão cheio de gente, ficaram-me na cabeça. Talvez porque sinto actualmente uma solidão completamente diferente da que alguma vez senti até hoje, aquela solidão que a Clarice Lispector descreveu tão bem e que tem a ver com o facto de ninguém ser eu a não ser eu, e ninguém poder estar dentro da minha cabeça a não ser eu. O que não seria necessariamente mau ou triste, se não se desse o caso de nem eu, que sou a única pessoa que está na minha cabeça, perceber o que quero.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Tan-tan-ran-taaaan

Retiro o que escrevi no outro dia. O pior toque de telemóvel não é o som de um bebé a rir. O pior toque de telemóvel, eu ouvi hoje, é o da música da tourada.

"Tan-tan-ran-taaaaan
Tan-tan-tan-tan-tan-ran-taaaaaan"

Ainda esperei para ver se o dono do telemóvel em questão atendia o telefone com um exclamativo "Olé!", mas não, foi apenas com um tímido e normalíssimo "tou".
Pena não ter ali uma bandarilha à mão para mandar naquela direcção.
Só para entrar no jogo.

terça-feira, 8 de abril de 2008

As pessoas que não nos querem ver felizes

Não acredito em bonecas vudu, em pragas, em mau-olhado, em invejas capazes de mexerem com a nossa felicidade (e darem cabo dela). Mas às vezes até acredito.
Há uns meses disseram-me “Espero que nunca sejas feliz.” Não liguei, desvalorizei, respondi que sabia que não era verdade, que era apenas da boca para fora e ia passar. Mas a réplica foi “não, não é da boca para fora, é o que penso. Espero que nunca sejas feliz.” Depois disso, não disse mais nada. Mas a verdade é que, volta e meia, esta frase volta para me atormentar.
Dizem que as pragas de ex-namorados são fortes e custam a passar. E eu até concedo que em matéria de amores a irracionalidade e o ciúme disparam mais depressa que um foguete em direcção às estrelas. Que é quase normal que se digam estas coisas quando a separação não é amigável, porque é impossível imaginar o nosso amor com outro amor ou dar-lhe uma palmadinha nas costas e falar sobre novas paixões. Perder numa relação não é perder num derby, a raiva e a dor de cotovelo não passam no dia seguinte. Nem no mês seguinte sequer (no Sexo e a Cidade a Charlotte defendia que o tempo de luto de uma relação deve ser calculado em função do total, e que para um namoro de dois anos é preciso um ano de luto, para três semanas uma semana e meia, e por aí fora… o que até faz algum sentido, apesar de pretender dar um lado exacto a uma “ciência” que não tem nada de exacto).
Enfim, a questão é quando a dor de cotovelo não passa NUNCA. Ou quando nem sequer vem de uma relação amorosa mas de um pretenso amigo, de um familiar ou de um conhecido. Quando há pessoas que pura e simplesmente não nos querem ver felizes.
Descobri que tenho uma veia assassina para com estas pessoas. Que se abrir bem os olhos descubro que há mais gente assim do que imaginaria, não só à minha volta mas à volta de pessoas de quem realmente gosto. Gente que se alimenta da nossa infelicidade, que espera o passo em falso para ser moralista, que ao perguntar como vai a vida responde um sonso “aaaaaaaaaannnnn” se dizemos que estamos maravilhosos e felizes. Pessoas que parece que se alimentam da desgraça alheia, como se a desgraça alheia lhes pudesse dar um sentimento de utilidade para salvar o desgraçado.
Acho que, odiando essas pessoas pelo seu egoísmo, devia desejar que nunca fossem felizes. Devia retribuir esse malfadado “espero que nunca sejas feliz.” Mas ainda assim continuo a querer é que vão à sua vidinha. Que sejam felizes e se esqueçam de mim no meio de tanta alegria. É isso, que se esqueçam de mim. Porque nunca se sabe o que um mau-olhado ou uma inveja cega podem fazer a uma pessoa.

domingo, 6 de abril de 2008

A primeira praia do ano

A primeira praia do ano foi hoje. Contra todas as previsões, domingo esteve melhor que sábado, pelo menos lá para as minhas bandas (oeste, sempre oeste), e depois de uma semana digna dos melhores dias de Junho e Julho, a abrir o apetite, era ver se alguém me demovia ou conseguia arrancar da praia ao mínimo sinal de sol.
Esteve bom, não tão bom como a semana prometia - veio o vento, vieram algumas nuvens, não fui à água - mas foi a primeira praia do ano. E a primeira praia do ano é um momento importante.
É o primeiro dia em que voltamos a cheirar o cheiro do creme protector, e cheira bem. O primeiro dia em que é mesmo suposto não fazer nada, nada, e ficar apenas de barriga esparramada ao sol. O primeiro dia em que voltam as primeiras sardas nas bochechas. O primeiro dia que de repente parece muito mais comprido, e dá para adormecer, conversar, dizer parvoíces e ler os semanários que no resto do ano ficam a agonizar pela semana fora. O primeiro dia em que se põe um chapéu na cabeça, uns óculos escuros, e se ganha automaticamente aquele ar de férias, nem que seja só por um dia. O primeiro dia em que se chega a casa com a pele diferente, e um cheiro a creme, areia, vento e maresia misturado. O primeiro dia em que o domingo à noite não tem aquele sabor horrível de segunda-feira de trabalho quase a chegar, porque estamos esbodegados mas sabe bem, e com um bom-humor vindo sabe-se lá de onde (aquilo da vitamina D só pode ser mesmo verdade).
A primeira praia do ano só tem um problema: deixa sempre vontade de mais. E agora sabe-se lá quando é que esse mais vai chegar...